quinta-feira, 15 de outubro de 2020

estou cansado,

mesmo assim, corro,

hoje fui ao nosso jardim,

estava vazio,

fiz-lhe companhia,

fiquei só, com ele,

senti que a tua presença era mais sentida que a minha,

sem ti, o jardim não riu,

o jardim não chorou,

o jardim não fez nada,

simplesmente existiu,

e assim permanecerá, até à tua chegada.

o coração, é frágil, e eu, nem tanto,

noites em que canto, no meu canto, que podia ser nosso, mas não é.

cansado, de subir, apenas para cair,

amargo, este sentimento permanente de desconforto,

sonhos em que estou morto,

não me trazem nada, mas contam-me,

o futuro, o que me espera,

alegria que me era, comum, normal,

agora, é só memória, desfalcada e adulterada,

mementos, sem momentos,

sem movimentos,

simplesmente, nevoeiro, de janeiro,

e as contas que fiz, onde seriamos três,

acabaram por resultar num grande zero,

zero que sou, ainda mais zero que quero ser,

cordas, fortes e rijas,

ao contrário de mim, suave e maleável,

sensação desprezável,

tempos, em que te via rir, despreocupada, com o que poderia ser,

tempos em que vivias, um beijo,

em que tinhas essência, em que eras tu mesma,

e não o fantasma do que foste,

e agora? persigo fantasmas, que nunca acho,

aqui, no escuro, nada acho,

é a ausência do ser,

é a inexistência do viver,

é aquela picada no rim,

é aquele aperto no coração,

quando não havia necessidade de pedir perdão,

e estou, bem, estou bem farto,

de acordar, de me levantar,

de olhar para um espelho, que nada me diz,

de olhar para estes olhos, que choram o que sou,

que choram quem fui, em tempos,

que era notório, ser. ser o que sou,

ser o henrique, que teve tudo,

agora, pinto com tinta corporal,

desenho com ardor animal,

desmembra o preconceito,

atira-o da janela,

discrimina nem a própria palavra, discriminação,

por isso, sé, alguém. alguém que queiras ser,

alguém que anseia o viver,

alguém que come sem esquecer,

o porquê de comer, o porquê de respirar,

o porquê de acordar.

gostava de acender o teu interior,

como fizeste ao meu,

conseguirei eu?

o mesmo eu que, te viu sair,

da minha vida, que jogou a mão,

e te perdeu? não sei, nem nunca hei de saber,

saber o que poderia, saber o que sentiria,

não gosto desta realidade,

nem da sua verdade,

inegável, palpável,

respira, para fora,

abre a gaiola, e voa para longe,

a sociedade está podre, no seu núcleo e exterior,

intragável sabor,

a enxofre, a morte, a miséria,

e o nojo inerente a quem escolhe provar,

os seus pecados, desmazelo total,

ignorância à flor da pele.

a raiva cresce e o impulso vem,

afinal, sou de quem?

serei o eu, que escrevo, noites em claro,

ou serei o eu, que cai em desamparo,

que explode, que envenena,

que pica, que ferra?

quem sou eu e o que faço aqui,

momentos que nunca revivi,

por me ser doloroso.

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